Dados comunitários podem auxiliar Municípios na prevenção e mitigação a desastres
Ações de adaptação para minimizar perdas e impactos causados pelas mudanças climáticas, como os desastres em decorrência de eventos climáticos extremos - cada vez mais frequente na rotina da população - foram debatidos na Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26), realizada em Glasgow, no Reino Unido. A Confederação Nacional de Municípios (CNM) destaca alguns projetos que realizam mapeamentos colaborativos e produção de dados comunitários e podem auxiliar a gestão local na mitigação e prevenção a desastres.
De acordo com o último levantamento feito em 2020 pela área de Defesa Civil da CNM, ocorreram 1.697 decretos de emergência e ou estado de calamidade pública em função das chuvas intensas. Os prejuízos chegaram a R$ 10,1, bilhões decorrentes dos excessos de precipitações pluviométricas, Isso inclui tempestades, ciclones, deslizamentos, inundações, enxurradas e tornados.
O setor de habitação foi o mais afetado, somando prejuízos de R$ 8,5 bilhões com a destruição ou dano de moradias. Segundo o levantamento, foram 280.486 moradias danificadas ou destruídas (274.266 foram danificadas e 6.220 destruídas). Os prejuízos em obras públicas aparecem logo em seguida, com impacto negativo em bueiros, calçadas, asfaltamento de ruas e avenidas, o que contribuiu para que os prejuízo chegasse a R$ 2,4 bilhões. Vale destacar que os prejuízos no aspecto “moradia ocupada” também foi destaque no ranking geral de notificação de desastres naturais.
Mapeamentos
Uma das ferramentas fundamentais para auxiliar os Municípios na prevenção e no gerenciamento de eventos extremos são os mapeamentos das áreas. Eles são utilizados para coletar dados dos territórios, sociais e econômicos como forma de estruturar a ação de resposta e políticas para determinadas áreas ou bairros da cidade relacionadas à prevenção, mitigação e adaptação a desastres.
O mapeamento e a elaboração das cartas geotécnicas de suscetibilidade, perigo e setorização de risco são importantes para o planejamento e gestão urbana. Todavia, esse tipo de produto ainda não está disponível para todos os Municípios, pois a maioria são produtos técnicos com valor elevado e requer apoio do governo federal, de universidades e de instituições científicas. A CNM lembra que parte significativa dos planos diretores, em especial dos médios e pequenos Municípios, não possuem mapas de áreas suscetíveis a desastres, como instrumentos de estratégias para subsidiar a gestão do território.
Ações
O projeto Dados à prova d’água (Waterproofing Data – WPD sigla em língua inglesa) tem sido uma das iniciativas que tem colaborado para construir comunidades sustentáveis e resilientes a inundações com a otimização de recursos. A iniciativa pretende engajar a população e os atores do setor público na geração e circulação de dados relacionados à inundação.
Na ação com as comunidades foi adotado um aplicativo móvel chamado Dados à prova d'água. A ferramenta traz uma abordagem de ciência cidadã, com o envolvimento de estudantes e professores de escolas no uso dessa ferramenta gratuita de monitoramento e geoinformação. Outras atividades incluem o mapeamento colaborativo com a participação ativa das pessoas dessas áreas suscetíveis a desastres, em especial inundações e alagamentos, bem como a gravação de memórias e história oral.
A iniciativa tem sido aplicada em duas áreas de estudo, nos Municípios de Rio Branco (AC) e São Paulo (SP). O uso do aplicativo móvel para a geração e circulação de dados foi ampliado para outras regiões do Brasil em setembro deste ano. Escolas e Defesas Civis de 10 Municípios nos em São Paulo, Acre, Santa Catarina, Pernambuco e Mato Grosso criaram redes observacionais com pluviômetros artesanais de mapeamento, coleta e geração de dados de chuvas.
Grupos comunitários
A partir deste mês, está sendo testado o uso do aplicativo móvel por grupos comunitários de Defesa Civil e comunidade escolar para informar dados dos pluviômetros artesanais, intensidade de chuva, áreas de alagamento e nível da água nas margens dos rios. O aplicativo permite receber dados oficiais de pluviômetro automáticos e áreas suscetíveis à inundação e visualizar todas essas informações na forma de mapa. Além disso, a população pode enviar fotos de regiões e áreas alagadas.
Para João Porto de Albuquerque, professor na Universidade de Glasgow e líder internacional do projeto, “em tempos de COP26 há muito interesse e conversas sobre mudanças climáticas e fica claro como o engajamento da sociedade para adaptação às novas condições climáticas é importante”. “É gratificante ver o nosso projeto oferecendo uma abordagem prática para enfrentar esse desafio com nosso aplicativo móvel sendo testado em diferentes regiões do Brasil. Estamos gerando evidências locais sobre os impactos das mudanças climáticas e produzindo dados para prevenção dos danos causados pelas inundações, ao mesmo tempo em que aumenta a consciência crítica das pessoas na comunidade sobre as mudanças climáticas e suas consequências”, explicou.
A geração do conhecimento deve auxiliar os Municípios e para Maria Alexandra Cunha, coordenadora do projeto na FGV, a iniciativa tem como diretiva ouvir as demandas e necessidades locais para melhorar a resiliência das comunidades. “A produção e a circulação de dados devem se dar dos centros de expertise para a população, por exemplo, com a emissão de alertas e informes técnicos, mas o conhecimento local em forma de dados de qualidade pode informar sistemas e modelos das prefeituras e outros governos para melhor gestão dos riscos de desastres”, enfatizou.
Rachel Trajber, coordenadora do Programa Cemaden Educação, espera que com o uso do aplicativo móvel os estudantes e cidadãos que vivem em áreas propensas a inundações tenham uma maior compreensão ambiental e urbana sobre a prevenção de riscos e desastres em tempos de incertezas e emergência climática. A iniciativa é promovida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pelo Centro de Estudos em Administração Pública e Governo (CEAPG) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (FGV EAESP) em parceria com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), o programa Cemaden Educação, a Universidade de Heidelberg (Alemanha) e a Universidade de Glasgow (Reino Unido), com o financiamento de um consórcio internacional e participação da FAPESP.
Governança urbana e prevenção
O projeto OpenStreetMap (OSM) tem sido uma das ferramentas utilizadas. A CNM destaca que é uma ferramenta livre e colaborativa de mapeamento digital com dados abertos em que qualquer pessoa pode fornecer informações geográficas sobre elementos presentes na superfície terrestre, tais como edifícios comerciais, escolas, hospitais, rodovias, áreas residenciais, ferrovias, dentre outros. Todos esses componentes geográficos são adicionados no mapeamento e as fontes são livres de direitos autorais.
Além disso, o coordenador do projeto, João Porto de Albuquerque, reforça que a ferramenta colaborativa é livre, sem custos, e com potencial de auxiliar a gestão pública na prevenção a desastres e também para fins humanitários por meio da produção de novos dados geográficos com o apoio de voluntários mundialmente, conhecida como a rede Humanitarian OpenStreetMap Team (HOT).
Um dos exemplos da relevância da rede colaborativa de apoio no Brasil foi o uso da ferramenta OpenStreetMap por voluntários para auxiliar os gestores no mapeamento das áreas, moradias e edifícios afetados pelo desastre tecnológico, como o que levou ao rompimento da barragem de contenção de rejeitos de minério de ferro em 2019 no Município de Brumadinho (MG). Em pouco mais de 48 horas, com o uso do OpenStreetMap e da rede de voluntários, o país já tinha um mapa pré-desastre, fundamental para auxiliar no planejamento das buscas e do resgate das vítimas, bem como na recuperação a longo prazo da cidade de Brumadinho (MG).
A CNM considera que a iniciativa tem enorme potencial de auxiliar a gestão urbana e a promoção de Municípios resilientes e incentiva os gestores a conhecer e utilizar, quando couber, a ferramenta para engajamento e apoio da governança local sustentável para resiliência urbana. Acesse aqui o tutorial de uso da ferramenta.
Por: Confederação Nacional de Municipios
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