Jardineiro que prestava serviços em casa de temporada na Serra tem vínculo de emprego reconhecido
Um jardineiro que prestou serviços de forma contínua em uma casa de temporada na serra gaúcha obteve o reconhecimento do vínculo de emprego doméstico, conforme decisão da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS). Os desembargadores fundamentaram que na relação entre as partes, que se estabeleceu de 2003 a 2020, estavam presentes todos os requisitos previstos no artigo 1º da Lei Complementar nº 150/2015 (pessoalidade, onerosidade, subordinação e continuidade). A decisão unânime da Turma confirmou a sentença proferida pela juíza Andreia Cristina Bernardi Wiebbelling, da 1ª Vara do Trabalho de Gramado.
Segundo consta no processo, o autor passou a prestar serviços para os réus após a morte do seu avô, que até então era o responsável por cuidar dos jardins da casa de temporada dos reclamados. Desde tal momento, vinha desenvolvendo atividades de jardinagem na casa, tais como cortar grama, varrer calçadas, limpar calhas e telhados, manter canteiros, o que lhe exigia que comparecesse diariamente ao local, de acordo com o trabalhador. Os réus, por outro lado, afirmaram que ele apenas lhes prestou serviços na condição de autônomo e nunca em frequência superior a dois dias por semana. Na versão dos reclamados, o serviço contratado era apenas de, eventualmente, cortar/aparar a grama do jardim e fazer a limpeza consequente. O pagamento era feito na conta bancária do avô do autor, e após, da avó, na importância de um salário mínimo mensal. Em seus argumentos, os reclamados ainda destacaram o fato de que a casa onde o autor reside até hoje foi doada pelos avós dos reclamados aos avós do autor, tratando-se, segundo eles, de uma longa relação de natureza “familiar”, e não de emprego.
Ao analisar o caso em primeira instância, a juíza Andreia Wiebbelling concluiu que a relação desenvolvida entre as partes continha todos os requisitos da relação de emprego doméstico: prestação de serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal à unidade familiar, sem finalidade lucrativa, no âmbito residencial daquela, por mais de dois dias por semana. A magistrada destacou o fato de o autor ser o único responsável pela manutenção do jardim da casa dos reclamados após a morte do seu avô, percebendo para tanto um valor fixo, independentemente do número de vezes que fosse necessário cortar a grama, podar as plantas e limpar o jardim. Além disso, a julgadora assinalou que a manutenção do jardim era realizada sempre que necessário, conforme a percepção do autor, sem haver um chamado específico para que seu serviço fosse prestado, ou seja, não era uma contratação pontual de um serviço de jardinagem. Por fim, a juíza registrou que o serviço de jardinagem não foi realizado por mais ninguém a não ser o autor no período de 2003 até 2020.
“Tais dados revelam a onerosidade da relação havida entre as partes, a não eventualidade e a pessoalidade, além da subordinação, eis que o autor laborava inserido na dinâmica mantida pelos réus para a manutenção de sua residência de temporada, os quais contavam com a força de trabalho do autor e com a responsabilidade desse para que mantivesse o jardim do local sem que necessitassem estar presentes para tanto”, expôs a juíza. Por fim, com relação à frequência da prestação de serviços, a magistrada ponderou que, ainda que a frequência do corte de gramas variasse entre uma e três vezes por mês, a depender da época, ficou provado que as funções do jardineiro não se resumiam apenas a cortar grama: o autor tinha de limpar o jardim, podar a cerca viva e cuidar das demais plantas, volume de tarefas que evidencia a necessidade de trabalhar por mais de dois dias na semana, afinal as realizava sem a ajuda de outro trabalhador.
Nesse panorama, a sentença acolheu o pedido do autor e declarou a existência de vínculo de emprego entre as partes no período de 1º de março de 2003 e 03 de julho de 2020, na função de jardineiro, com remuneração de um salário mínimo mensal.
As partes recorreram ao TRT-RS. O relator do caso na 2ª Turma, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, explicou inicialmente que, uma vez reconhecida a prestação de serviços de jardinagem, inverte-se o ônus probatório, passando a ser dos demandados a incumbência de comprovar que o trabalho possuía natureza jurídica diversa da relação de emprego, ônus do qual, no entender do julgador, os réus não se desincumbiram a contento. Nesse sentido, com relação ao elemento da pessoalidade, o magistrado destaca não haver qualquer subsídio no processo dando conta da possibilidade de o autor se fazer substituir por outro trabalhador. Além disso, o jardineiro possuía a chave do portão da casa, “circunstância que fortalece a relação de pessoalidade que havia entre as partes e comprova a típica confiança presente na relação de emprego”, manifestou o julgador.
Quanto ao requisito da onerosidade, o magistrado salienta que o trabalhador recebia um salário mínimo e não um valor proporcional aos serviços prestados, o que contribui para a caracterização de relação de emprego. No seu entendimento, se fosse verdadeiramente uma relação de prestação de serviços autônomos, os valores pagos seriam variados, de acordo com o serviço realizado, e não uma cifra fixa.
O relator assinalou que também estavam presentes os requisitos da continuidade e da subordinação. Quanto ao primeiro, a prova testemunhal deixou claro que o trabalhador comparecia quase diariamente ao local de trabalho. E no que se refere à subordinação, esta se manifestava nas orientações recebidas pelo trabalhador por parte dos reclamados, com relação às tarefas a serem cumpridas e quanto ao estilo de jardinagem a ser adotado (estilo inglês).
Nessa linha, os desembargadores decidiram manter a decisão da sentença de origem, reconhecendo a existência de relação de emprego entre as partes, na função e no período postulados pelo trabalhador.
O processo envolve ainda outros pedidos. Também participaram do julgamento os desembargadores Marçal Henri dos Santos Figueiredo e Clóvis Fernando Schuch Santos. Cabe recurso do acórdão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Fim do corpo da notícia.
Fonte: Bárbara Frank (Secom/TRT-RS)
Por: Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
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