Seminário promovido pelo TSE sobre proteção de dados pessoais reúne centenas de participantes
Ao encerrar, nesta quarta-feira (10), o Seminário “Proteção de Dados – A LGPD e seus impactos na Justiça Eleitoral e na Administração Pública”, o presidente da Comissão de Direito Político e Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), Fernando Neisser, classificou o encontro virtual como um evento “brilhante”, que trouxe à tona uma série de questões importantes para a adequação da Justiça Eleitoral à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). O seminário foi promovido pela Escola Judiciária Eleitoral do Tribunal Superior Eleitoral (EJE/TSE).
Durante três dias, especialistas em Direito Digital e em proteção de dados debateram diversos temas relacionados à LGPD no âmbito da Administração Pública. Para a juíza ouvidora do TSE, Simone Trento, o êxito histórico do evento foi consolidado pelas centenas de participantes e por milhares de visualizações no canal oficial da Justiça Eleitoral no YouTube.
O primeiro painel da tarde de hoje, mediado pela advogada e assessora da Presidência do TSE Fernanda Lage teve como tema “Cláusulas contratuais de sigilo em contratos com o poder público (auditorias, consultorias)”. Os expositores foram o procurador do estado de São Paulo Roberto Castellanos Pfeiffer e o juiz federal Valter Shuenquener de Araújo.
Valter Shuenquener iniciou o debate destacando a relevância da LGPD e a importância de se debater o tema. Ele citou algumas novidades sobre a lei que estão aparecendo no mundo jurídico e ressaltou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já editou três atos criando comitês e grupos de trabalho para pensar uma política de dados abertos compatível com a proteção de dados pessoais no âmbito do Poder Judiciário. Ele também ressaltou a obrigação de cada instituição pública de zelar pelo controle de legalidade dos atos.
Roberto Pfeiffer defendeu o compartilhamento restrito de dados sigilosos de contratos firmados entre o poder público e a iniciativa privada em casos excepcionais, como no planejamento de ações voltadas à saúde e à segurança pública, por exemplo.
Direito ao esquecimento
Em seguida, a especialista em Direito Digital Renata Capriolli Zocatelli Queiroz e o analista judiciário do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (TRE-MA) Volgane Oliveira Carvalho falaram sobre “Dados pessoais e direito ao esquecimento”. O painel teve como mediadora a vice-diretora da EJE/TSE, Caroline Lacerda, que destacou o alto nível dos debates e a qualidade técnica do evento, que “certamente será fonte de conhecimento por muito tempo”.
Renata Zocatelli lembrou que o ordenamento jurídico brasileiro não possui nenhuma previsão legal do que seria o direito ao esquecimento, mas ressaltou que a construção doutrinária leva em consideração dois aspectos para tratar desse conceito: a informação e o tempo. Ela citou casos emblemáticos no Brasil, como a chacina da Candelária, em 1993, no Rio de Janeiro, e o assassinato da jovem Aída Curi, caso que está sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
“A LGPD não trata especificamente do direito ao esquecimento, contudo, ela traz um direito relacionado, que é o direito à eliminação dos dados”. Para ela, a possibilidade de solicitar a exclusão dos dados revela uma maior abertura do legislador em relação ao tema.
Volgane Carvalho ressaltou que a doutrina elenca três pontos que não podem ser atingidos pelo direito ao esquecimento: o interesse público; a utilidade da informação; e o potencial de dano, ou seja, se existe o direito de “pedir que se esqueça algo que pode ser danoso à imagem, à reputação e à intimidade, mas não banalidades e coisas abstratas”.
Filiação partidária
O terceiro painel abordou a temática “Filiação a partido político. Dado pessoal público? Para sempre?”. As exposições foram mediadas pela advogada e assessora do gabinete da Presidência do TSE Lara Marina Ferreira. O palestrante foi o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Carlos Affonso de Souza.
Em sua exposição, ele ressaltou que informações sobre filiação partidária não são apenas um dado pessoal, mas um dado pessoal sensível protegido pela LGPD, que traz uma série de garantias e restrições para seu acesso e utilização. Para ele, a Justiça Eleitoral deve dar atenção especial a esse ponto, pois transparência e privacidade devem caminhar juntas. “Esse encontro da LGPD com a legislação eleitoral é um trabalho em desenvolvimento que precisa ser muito bem pensado”, afirmou.
Pessoas falecidas
Já o painel “Dados pessoais de pessoas falecidas (eleitores, candidatos, doadores, fornecedores, colaboradores)”, coordenado pela advogada e assessora da Vice-Presidência do TSE Polianna Pereira dos Santos, reuniu a mestre em Direito Privado Luciana Dadalto e a advogada e assessora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Lívia Teixeira Leal.
Para Luciana Dadalto, a visão de que o que pertence ao morto é necessariamente algo que pertence a seus familiares tem sido questionada em todo o mundo. “Cada vez mais, nós temos reconhecido que eu posso morrer, mas posso continuar existindo pelas informações e dados que eu deixo”. Segundo ela, é importante que as pessoas vivas tenham a oportunidade de escolher como querem que seus dados sejam tratados após a morte. “A vida não é apenas biologia, ela é biografia”, enfatizou.
Lívia Teixeira Leal afirmou que a LGPD brasileira não possui nenhuma previsão específica sobre o tratamento e a proteção de dados pessoais de pessoas falecidas, daí a importância de a Justiça Eleitoral manter seu banco de dados sempre atualizado para prevenir eventuais fraudes utilizando informações de eleitores mortos. “A Justiça Eleitoral não pode ignorar a importância do tratamento adequado dos dados pessoais de pessoas falecidas”, completou.
História e memória
Coordenado pela assessora especial da Presidência do TSE, Roberta Maia Gresta, o painel “Dados pessoais de candidatos. Privacidade e transparência. História e Memória” contou com a participação do diretor-fundador do Data Privacy Brasil, Bruno Ricardo Bioni, e do fundador do Instituto Liberdade Digital, Diogo Rais Rodrigues Moreira.
Para Bruno Bioni, como o direito à proteção de dados pessoais de candidatos é um direito autônomo e distinto do direito à privacidade, é preciso definir os limites e as possibilidades do uso desses dados para guardar a história e a memória dos processos eleitorais. Ele defende que os dados sejam preservados para efeito de série histórica mediante acesso restrito. “A proteção de dados pessoais não é contra a transparência, a história e a memória. A questão é como se fazer e como balancear esses direitos”, destacou.
Diogo Rais concordou com os argumentos, mas criticou o excessivo detalhamento de informações referentes a bens móveis e imóveis dos candidatos, como endereços residenciais e placas de veículos, por exemplo. “Precisamos avaliar a real necessidade de tantos dados disponíveis”, ponderou.
Prestação de contas
O último painel do dia foi mediado pelo assessor do TSE e membro do Núcleo de Inteligência da Justiça Eleitoral Eron Pessoa. As expositoras Tatiana Kolly Wasilewski Rodrigues e Marilda Silveira, mestres em direito público, discorreram sobre “Dados pessoais de candidatos e de terceiros em prestações de contas”.
Eron Pessoa abriu o debate afirmando que a LGPD trouxe enormes desafios para a área de fiscalização, que precisa encontrar o equilíbrio entre a publicidade das informações e a proteção de dados pessoais dos financiadores das campanhas eleitorais.
Em sua exposição, Tatiana Wasilewski propôs a fixação de limites financeiros para a publicidade e a identificação dos doadores, a exemplo do que ocorre em países da Europa e nos Estados Unidos.
Marilda Silveira defendeu uma nova política de proteção e gestão de dados pessoais referentes às prestações de contas. Para ela, todos os dados inseridos nas prestações de contas são sensíveis, pois sempre revelam uma posição política, uma afinidade, ou um direcionamento, “transformando essas informações em dados sensíveis”.
A palestra de encerramento coube ao presidente da Comissão de Direito Político e Eleitoral Iasp, Fernando Neisser, que propôs uma reflexão sobre a aplicação da LGPD no tratamento de dados de eleitores por candidatos e campanhas eleitorais.
Ele ressaltou que o mundo vive uma grande revolução que afeta toda a sociedade: a revolução dos dados, com sua imensa capacidade computacional, cruzamento de algoritmos e softwares potentes e acessíveis. E, diante de tanta tecnologia barata e disponível à população, Neisser defendeu que todo eleitor tem o direito de receber propaganda eleitoral pelos meios digitais.
De acordo com ele, os dados sensíveis dos eleitores precisam ser protegidos, mas as informações de contato devem estar disponíveis e ser de livre circulação, a fim de garantir que os candidatos consigam chegar aos eleitores.
Acesse a programação completa do Seminário.
Veja como foi o terceiro dia do evento.
MC/LC, DM
Leia mais:
09.02.2021 - 2º dia de evento destaca preocupação com as fake news e papel da Autoridade Nacional de Proteção de Dados
08.02.2021 - Seminário debate LGPD na Administração Pública
05.02.2021 - Seminário sobre Lei Geral de Proteção de Dados começa na próxima segunda (8)
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Gestor responsável: Assessoria de Comunicação
Por: Tribunal Superior Eleitoral
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