Trabalho infantil: crise econômica e pandemia acendem alerta para risco de retrocesso
Neste domingo, 12 de junho, é celebrado o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, num cenário marcado, nos últimos dois anos, por uma pandemia que agravou, ainda mais, a situação de pobreza de milhões de pessoas. Diversos fatores, como o fechamento das escolas, podem ter contribuído para levar crianças e adolescentes ao trabalho, como forma de aumentar a renda familiar, o que representa um retrocesso de anos no combate a essa prática.
A Justiça do Trabalho sempre esteve engajada na luta pela erradicação do trabalho infantil, um propósito prioritário de toda humanidade. De acordo com o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Evandro Valadão, coordenador do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo a Aprendizagem da Justiça do Trabalho, é evidente a importância de uma ação que amplie a visibilidade do tema. “ Informar e mobilizar o próprio sistema de justiça, a fim de atuar de modo adequado, coordenado e em regime de cooperação, é parte desse movimento, que vai muito além, para tentar ser a voz e o verbo do combate ao trabalho infantil, em conjunto com a sociedade”, afirma.
Mobilização digital
Como forma de chamar a atenção da sociedade para o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, a Justiça do Trabalho, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), promoveu, nesta sexta-feira (10), um twittaço contra o trabalho infantil. A hashtag #BrasilSemTrabalhoInfantil esteve entre os assuntos mais comentados do Twitter Brasil (trend topics) e, até a tarde de sexta, já havia alcançado mais de 130,1 milhões de visualizações (impressões) e atingido quase 45,8 milhões de contas (perfis) na rede social.
A ação digital teve a adesão de diversas instituições públicas e privadas, além de vários usuários da rede social. Participaram da mobilização times de futebol brasileiro, como Flamengo, Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Santos, Atlético-MG, Cruzeiro, Cuiabá e Paysandu Sport Club, além de personalidades, como a apresentadora Eliana, o músico Carlinhos Brown, o grupo Olodum e o jornalista Leonardo Sakamoto.
Diversos entes públicos e organizações também aderiram ao twittaço, com destaque para o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Superior Tribunal Militar (STM), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Câmara dos Deputados. Os tribunais regionais do trabalho e os tribunais de justiça estaduais, além da associações de magistrados do trabalho e universidades também contribuíram para a ação.
Trabalho infantil e pandemia
Informações divulgadas pela OIT e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), reunidas no relatório “Trabalho infantil: Estimativas globais de 2020, tendências e o caminho a seguir” (disponível somente em inglês), alertam que, entre 2016 e 2020, o número de crianças e adolescentes nessa situação chegou a 160 milhões em todo o mundo, representando um aumento de 8,4 milhões.
Ainda segundo a pesquisa, em razão dos impactos da covid-19, avalia-se que, até o final de 2022, mais 8,9 milhões correm o risco de ingressarem nesse grupo. Um modelo de simulação mostra que o número pode aumentar para 46 milhões se não houver acesso a uma cobertura crítica de proteção social.
No Brasil, antes da pandemia, já havia mais de 1,7 milhão de crianças e adolescentes nessa situação. O relatório aponta que o progresso no combate à prática se estagnou, pela primeira vez em 20 anos, revertendo a tendência de queda anterior, com a diminuição de 94 milhões entre 2000 e 2016.
Para o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, as novas estimativas são um alerta. “Não podemos ficar parados enquanto uma nova geração de crianças é colocada em risco”, afirma. “A proteção social inclusiva permite que as famílias mantenham crianças e adolescentes na escola, mesmo em casos de dificuldades econômicas. Este é um momento de compromisso e energia renovados, para reverter essa situação e quebrar o ciclo da pobreza e do trabalho infantil”.
Fechamento das escolas
As crises econômicas e o fechamento das escolas podem ter intensificado a presença de crianças e adolescentes em situação de trabalho por mais horas ou em piores condições, em decorrência da perda de emprego e renda de pais, mães ou responsáveis. “Estamos perdendo terreno nessa luta”, avalia a diretora executiva do Unicef, Henrietta Fore. “Precisamos priorizar os investimentos em programas que possam levá-los de volta à escola, além de programas de proteção social que ajudem as famílias a evitar essa escolha".
Pobreza Infantil
O estudo “Pobreza Infantil Monetária no Brasil – Impactos da pandemia na renda de famílias com crianças e adolescentes (link para outro sítio)”, do Unicef, traz dados de 2020 que comprovaram que esse grupo continua sendo o mais afetado pela pobreza monetária no Brasil. O auxílio emergencial concedido pelo governo federal contribuiu temporariamente para a redução desses índices, mas, segundo Florence Bauer, representante da Unicef no Brasil, não se propôs a resolver o problema da pobreza em médio e em longo prazo. “Isso precisa ser feito por meio de políticas de proteção social duradouras e sustentáveis”, defende.
OIT
A OIT, em colaboração com a parceria global Aliança 8.7, lançou 2021 como o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil. O propósito era promover ações legislativas e práticas em todo o mundo, mobilizando os governos a atingirem os objetivos previstos na Meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS) - a erradicação do trabalho forçado, da escravidão moderna e do tráfico de seres humanos e a proibição e a eliminação das piores formas de trabalho infantil, incluindo o recrutamento e o uso de crianças como soldadas. Estabelece, também, que, até 2025, o trabalho infantil, em todas as suas formas,, seja completamente erradicado.
A Convenção 182 da OIT, que trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e de ação imediata para sua eliminação, dispõe expressamente acerca de medidas para assegurar a reabilitação e a integração social do grupo afetado. Essa obrigação deve ser observada por todos os Estados-membros da OIT.
Pnad
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (link para outro sítio) (Pnad Contínua), em 2019 havia 1,768 milhão de pessoas entre cinco a 17 anos em situação de trabalho. O número representa 4,6% da população nessa faixa etária. Nesse universo, 706 mil estavam em ocupações consideradas as piores formas de trabalho infantil, e o percentual em trabalho infantil perigoso (27,6%), em jornadas de até 14 horas, supera o de pessoas que realizavam atividades econômicas (23,3%).
De acordo com a Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), essas atividades envolvem a operação de tratores e máquinas agrícolas, o beneficiamento do fumo, do sisal e da cana-de-açúcar, o trabalho em pedreiras, a produção de carvão vegetal, a coleta, a seleção e o beneficiamento de lixo, o comércio ambulante e o trabalho doméstico, entre outras.
A pesquisa revela, ainda, que, em 2019, 51,8% da população de pessoas de cinco a 17 anos de idade realizavam tarefas domésticas ou cuidavam de pessoas. A maioria tem de 16 a 17 anos, e mais da metade (57,5%) é de mulheres.
Oportunidades
A Constituição Federal (artigo 7º, inciso XXXIII) proíbe qualquer forma de trabalho a pessoas com menos de 16 anos, exceto na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. Oferecer oportunidades de trabalho protegido a adolescentes é fundamental para enfrentar o trabalho infantil e a evasão escolar. Nesse sentido, a Lei da Aprendizagem determina que toda empresa de médio ou grande porte tenha de 5% a 15% de aprendizes, permitindo que jovens entre 14 e 24 anos, que estejam cursando o ensino médio, tenham oportunidades de formação técnico-profissional.
Segundo dados de 2016 do Ministério Público do Trabalho (MPT), menos de 10% das empresas cumprem a determinação legal, deixando de gerar mais de três milhões de vagas.
A boa notícia é a mobilização, encabeçada pelo Unicef, em parceria com empresas privadas, organizações civis e governos que oferecem oportunidades de acesso, formação e capacitação profissional. O programa Um Milhão de Oportunidades, criado em 2020, já ofereceu mais de 105 mil vagas.
Justiça Social
A Justiça do Trabalho é um observador privilegiado dos fenômenos sociais e está engajada na luta pela erradicação total do trabalho infantil no Brasil até 2025. Em 2012, por iniciativa do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), foi criada a Comissão para Erradicação do Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho (Ceti). Em 2016, a ação institucional teve o nome modificado para Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem.
“A Justiça do Trabalho é, eminentemente, o ramo do Judiciário vocacionado para, a partir de suas decisões, realizar, efetivamente, a justiça social”, ressalta o coordenador do programa, ministro Evandro Valadão. “Nossa participação efetiva em campanhas e eventos de esclarecimento sobre o tema atendem ao propósito de enfrentamento de uma dura realidade e da exclusão do direito de ser criança, que lhes nega a oportunidade de aprendizagem e as exclui de uma velhice digna e economicamente justa”, resume.
Em 2019, o TST lançou o Manual do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem (link para outro sítio), que oferece informações, dados e orientações sobre as ações desenvolvidas. Em março deste ano, em parceria com o Centro Salesiano do Adolescente Trabalhador (Cesam), o Tribunal relançou e ampliou o programa Adolescente-Jovem Aprendiz, que prevê a contratação, com carteira assinada e jornada de quatro horas diárias e pessoas entre 14 e 24 anos regularmente matriculadas na rede pública de ensino do Distrito Federal.
Inteligência artificial
A Justiça do Trabalho tem feito uso da inteligência artificial para melhor gestão dos processos judiciais sobre o tema. Assim, para o cumprimento da Meta 9 do CNJ (link para outro sítio), em 2021, no que tange à integração do Poder Judiciário à Agenda 2030, foi realizado um projeto piloto em alguns Tribunais Regionais do Trabalho para o mapeamento dos processos envolvendo trabalho infantil e assédio sexual, com base no Processo Judicial Eletrônico (PJe).
Atualmente, está em andamento, com o envolvimento dos 24 TRTs, um projeto nacional que possibilitará identificar processos sobre a matéria em toda a Justiça trabalhista.
Denúncias
Ao presenciar alguma situação de trabalho infantil, denuncie. Confira os canais oficiais de denúncias:
Disque 100
O Disque Direitos Humanos (Disque 100) é um serviço de disseminação de informações sobre direitos de grupos vulneráveis e de denúncias de violações de direitos humanos. O serviço funciona 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. As ligações são gratuitas e podem ser feitas de qualquer telefone, fixo ou móvel. Somente em 2021, foram registradas mais de 100 mil denúncias de violações de direitos humanos contra crianças e adolescentes. Os dados são do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH).
Conselho Tutelar
Consulte aqui os endereços do Conselho Tutelar do Rio de Janeiro (link para outro sítio).
Delegacia Regional do Trabalho
Entre em contato com uma das Delegacias do Trabalho do Rio de Janeiro, que oferece o serviço "Denúncias On-line". Outro canal de denúncia é o site gov.br (link para outro sítio).
Ministério Público do Trabalho
Conselho Superior da Justiça do Trabalho
Denúncias também podem ser encaminhadas para a Ouvidoria do CSJT (link para outro sítio).
Fonte: CSJT
Por: Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro
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