Exclusividade da PGR gera críticas, mas há consenso sobre mudança na Lei de Impeachment
Os juristas divergem, contudo, sobre o trecho da decisão do ministro Gilmar Mendes que dá competência exclusiva à Procuradoria-Geral da República para denunciar integrantes do STF por crimes de responsabilidade. A medida cautelar, publicada nesta quarta-feira (3/12), ainda será analisada pelo Plenário do Supremo, em julgamento virtual de 12 a 19 deste mês.
Constitucionalistas criticaram exclusividade da PGR, mas concordam que Lei de Impeachment precisa mudar
A decisão de Gilmar, que é contestada pelo Senado e pela Advocacia-Geral da União, modifica a interpretação de vários trechos da Lei de Impeachment. O ministro defende a suspensão da expressão “a todo cidadão” do artigo 41 da Lei 1.079/1950, que permite a qualquer pessoa pedir o afastamento de membros da corte.
Parte dos especialistas consultados pela ConJur se opõe a essa restrição. Eles argumentam que a exclusividade da PGR enfraquece a legitimidade democrática do Supremo em relação ao povo, que é a fonte de onde emana o poder, segundo a Constituição.
“A possibilidade de qualquer cidadão apresentar um pedido de impeachment é requisito de accountability [responsabilização] da instituição com o povo. Não é razoável que isso seja retirado do cidadão”, avalia Ingrid Dantas, doutora em Direito pela Universidade de Brasília e professora de Direito Constitucional.
“Eu não vejo, em princípio, nenhum motivo constitucional para reduzir essa competência ao PGR. O impeachment é um procedimento democrático em que há uma ampla possibilidade de se solicitar. Mas é certo que a Lei de Impeachment precisa ser examinada para se adequar à Constituição”, sintetiza o constitucionalista Pedro Serrano, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
“Ao prever que qualquer cidadão pode denunciar, esse artigo da Lei de Impeachment vai ao encontro do Estado Democrático de Direito. Então me parece que é plenamente constitucional”, avalia a advogada Vera Chemim, especialista em Direito Constitucional e mestre em Administração Pública pela FGV de São Paulo.
Para outros estudiosos, porém, a possibilidade de que ministros do STF sejam alvos de pedidos de impedimento sem lastro técnico abre margem para perseguições políticas.
“A Lei do Impeachment deve ter seu sentido continuamente atualizado, de modo a ser lida à luz da realidade brasileira contemporânea, marcada pela emergência de impulsos de populismo autoritário que transformaram o Supremo Tribunal Federal em bode expiatório dos problemas nacionais, convertendo-o em um inimigo público ficcional”, aponta o constitucionalista Georges Abboud, também professor da PUC-SP.
Trâmite no Senado
Apesar da controvérsia sobre a competência da PGR, outros pontos da decisão de Gilmar têm apoio amplo entre os constitucionalistas. O principal deles é o que passa a exigir maioria qualificada de dois terços do Senado para que a denúncia contra um ministro do STF seja recebida e, posteriormente, julgada procedente pelo plenário da Casa.
Hoje, as duas etapas exigem apenas maioria simples — mais da metade dos presentes à sessão — como preveem os artigos 47 e 54 da lei.
Os especialistas apontam, também, que Gilmar acerta em afastar interpretações que permitem punir os magistrados pelo mérito de suas decisões. Segundo o artigo 39 da lei, um ministro do STF pode sofrer impeachment por “ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo”, ou por “proceder de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções”.
“Esses dispositivos são subjetivos e estão sujeitos a ampla discricionariedade. Ao permitir um impeachment de ministro do STF sob essas premissas, a lei abre margem para que esse instrumento seja politizado para atacar o conteúdo material de uma decisão do Supremo”, avalia Ingrid Dantas.
Contexto político
A discussão sobre a atualização da Lei do Impeachment não é inédita. O STF já havia revisado pontos da norma na ADPF 378, julgada em dezembro de 2015, que tratou do rito aplicável ao Presidente da República. O STF definiu, na ocasião, que o Senado teria competência para instaurar ou não o processo de impedimento, depois da autorização da Câmara, e que a admissibilidade exigia apenas maioria simples — dispositivo que agora foi derrubado por Gilmar.
Ao tomar a decisão atual, no âmbito das ADPFs 1.259 e 1.260, Gilmar avaliou que o aval de apresentação de denúncia “a todo cidadão” viabiliza a criação de um ambiente propício à “proliferação de denúncias motivadas por interesses político-partidários, desprovidas do rigor técnico necessário para uma acusação legítima”.
“Esse cenário expõe os membros dos Tribunais Superiores a constantes riscos de serem alvos de processos de impeachment baseados em discordâncias políticas ou em divergências interpretativas legítimas, convertendo o legítimo instrumento do impeachment em um meio de propagação do arbítrio pela intimidação e retaliação política”, justificou o ministro na decisão.
O panorama exposto por Gilmar tem lastro nos movimentos atuais do Congresso. Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) assumem abertamente o objetivo de ampliar a base da oposição no Senado, nas eleições de 2026, para formar quórum suficiente e pautar o impeachment de ministros do STF, em especial de Alexandre de Moraes.
Para Gilmar, a mera ameaça de impeachment pode funcionar como um “mecanismo eficaz para constranger membros do Poder Judiciário”. Portanto, a restrição da competência ao PGR é um “filtro rigoroso” para garantir a seriedade e o rigor técnico do processo.
O atual PGR, Paulo Gonet, defendeu a competência exclusiva do órgão ao se manifestar nos autos das ADPFs. Ele apontou que a Lei de Impeachment prevê um “rito procedimental incompatível com a Constituição Federal de 1988” e que os ministros do STF desempenham uma função contramajoritária com base nos “valores e princípios permanentes da Constituição” e não no “sentimento político dos eleitores”.
Por: Consultor Jurídico
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