CNJ - 05 de Fevereiro
Projetos premiados privilegiam leitura e aprendizagem profissional de jovens
A preocupação com a preparação profissional, o cumprimento da lei e as transformações que a cultura pode trazer aos adolescentes e jovens é o que tem motivado o desenvolvimento de projetos no Sistema de Justiça voltados a esse público. Reconhecidos pelo Prêmio Prioridade Absoluta, concedido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as iniciativas têm envolvido os setores público e privado, a fim de dar melhores condições a essas pessoas, tanto no contexto protetivo quanto no socioeducativo.
Vencedor da categoria Sistema de Justiça – Eixo Protetivo na edição de 2024, o projeto Capacita: Cumprimento Alternativo da Cota de Aprendizagem Profissional – Cooperação, Inclusão e Transformação de Adolescentes foi implantado pelo Ministério Público do Trabalho do Ceará (MPT-CE) em 2023. A iniciativa foi criada para assegurar o direito à profissionalização de adolescentes em situação de vulnerabilidade e risco social, além de viabilizar o cumprimento da cota de aprendizagem pelas empresas de prestação de serviços terceirizados.
O projeto funciona por meio de acordos de cooperação entre empresas, entidades formadoras e órgãos públicos. Nessa parceria, as empresas contratam os aprendizes, as entidades formadoras promovem a formação teórica e os órgãos públicos entram com a experiência prática. A cota para esse público tem previsão legal na nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021); na legislação trabalhista (CLT) e no Decreto 9578/2018. As empresas devem ter, no mínimo, 5% de aprendizes do total de funcionários.
Para atender essa obrigação, o MPT-CE realizou uma audiência pública com as 200 maiores empresas do estado, com o objetivo de verificar suas dificuldades e propor uma mediação. Assim, aquelas que não têm espaço para receber os aprendizes, acertam um termo de compromisso com Ministério Público, que media a contratação com órgãos públicos. A Justiça Federal, por exemplo, recebeu 25 jovens em 2024. No total, mais de 5 mil aprendizes foram contratados em um ano de funcionamento do projeto Capacita.
O termo também prevê a inscrição do aprendiz em uma instituição formadora, que pode ser do Sistema S ou da sociedade civil. Os aprendizes têm, assim, uma formação teórica e desenvolvem a prática nas empresas ou órgãos públicos.
Segundo o procurador do Trabalho responsável pelo projeto, Antonio de Oliveira Lima, essa é uma obrigação imposta a todas as empresas do país e as dificuldades em cumpri-las também acontecem em âmbito nacional. No Ceará, no entanto, o Ministério Público chama as empresas para audiências individualizadas e, assim, desenha a solução para que a lei seja cumprida.
O projeto prioriza jovens e adolescentes institucionalizados em abrigos, vítimas de violência doméstica e com famílias de baixa renda. O Capacita também atende jovens e adolescentes que estão cumprindo medidas socioeducativas. No caso dos que estão em regime fechado – quer rapazes, quer moças -, tanto os cursos de formação, quanto a parte prática são desenvolvidas dentro da unidade.
O contrato dos aprendizes é de no máximo dois anos, com jornadas reduzidas (até 4h por dia) e frequência escolar no contraturno. Os jovens também cumprem uma carga horária nos dias que estão na instituição formadora. O curso do Senai, por exemplo, é de 400h/aula ao longo do curso. “A obrigação de cumprir a cota é contínua”, ressalta Antonio de Oliveira. Por isso, o projeto Capacita deve chamar outras 300 empresas em 2025, com destaque para as que têm maior déficit de cumprimento da lei das cotas de aprendizagem, para assinarem os termos de compromisso.
Esta não é a primeira vez que o MPT-CE vence o Prêmio Prioridade Absoluta. Em 2022, o mesmo procurador recebeu o reconhecimento pela Rede Peteca, que atua pelo fim do trabalho infantil no Ceará e o projeto Conapeti recebeu Menção Honrosa. “Trabalhamos com pessoas engajadas, que queiram mudar a realidade dos nossos jovens”, afirma. Para ele, a premiação é o reconhecimento de um esforço conjunto em prol da aprendizagem profissional de adolescentes e jovens no Ceará.
Liberdade pela Arte
Já no Amazonas, a Defensoria Pública do estado foi a vencedora no Eixo Socioeducativo, voltado a adolescentes em conflito com a lei. Iniciado em 2019, o projeto LibertAr-te é realizado em todos os centros socioeducativos da capital Manaus e pretende trazer a liberdade por meio da leitura. A iniciativa se baseia na arte como instrumento de resgate, além de incentivar o hábito da leitura.
Conforme a defensora Juliana Lopes, idealizadora do projeto, as atividades de leitura são propostas de modo que haja a participação voluntária dos adolescentes, fomentando debates, reflexões e vínculos. Ela explica que, ao longo do ano, são fornecidos cerca de 12 livros de temas diversos, escolhidos pelos socioeducandos. As obras passam primeiro pelo crivo da equipe, antes de ser disponibilizado para a leitura.
A defensora diz que o objetivo é que os rapazes e moças vejam que é possível um outro mundo fora do contexto que eles conhecem. “Recebemos esse prêmio e ressaltamos que a força da educação é, muitas vezes, esquecida. Um reconhecimento do CNJ de um projeto da Defensoria é muito importante, pois nos motiva para novos projetos em 2025”, afirma.
A equipe do projeto projeto LibertAr-te na cerimônia de entrega do Prêmio Prioridade Absoluta – Foto: Allan Lobo/DPE-AM
O projeto surgiu depois que as meninas da unidade feminina começaram a pedir para ler outros livros além da Bíblia. O primeiro título foi “O Diário de Bitita”, da escritora brasileira Carolina Maria de Jesus, publicado em 1986. No livro autobiográfico, a autora narra desde seus primeiros anos de vida, passa por toda sua infância, adolescência e o princípio de sua vida adulta. Na roda de conversa, a assistente social percebeu que as adolescentes não apenas conseguiram completar a leitura, como também apresentaram uma visão aprofundada daquela realidade. À época, a unidade tinha sete adolescentes.
Os 30 rapazes da unidade masculina também se interessaram pela roda de leitura e, a partir disso, foi preciso institucionalizar o projeto para que pudesse ser custeado. Outras obras como “Estação Carandiru”, “O Diário de Anne Frank”, “Meu pé de laranja lima” e livros em quadrinhos fizeram parte da iniciativa. Nem mesmo a pandemia parou a ação. A roda de leitura passou a ser feita por videochamada, até a reabertura das unidades. “Nesse período, tentamos acompanhar a leitura dos adolescentes, com algumas atividades voltadas para aquele livro, como a apresentação de filmes, desenhos sobre a obra e rodas de conversa”, explica a defensora.
Juliana Lopes ressalta que o “LibertAr-te tem o propósito de libertar esses jovens, mesmo privados de liberdade física”. Para ela, o projeto conseguiu ajudar todos os adolescentes que passaram pela unidade de internação. “Temos vários planos para o projeto em 2025. Ganhar esse prêmio fortaleceu a intenção de desenvolver ideias que possam contribuir para o futuro dos rapazes e moças que entram nas unidades”, destaca.
Infância e juventude
O Prêmio Prioridade Absoluta seleciona, premia e dissemina ações, projetos ou programas inovadores e eficazes voltados para a promoção, a valorização e o respeito aos direitos de crianças, adolescentes e jovens.
A ação pretende dar visibilidade às práticas de sucesso que promovem os direitos infantojuvenis, além de proporcionar a troca de experiências e informações e propor a modernização e a eficiência dos projetos. A cerimônia de premiação da quarta edição ocorreu em dezembro de 2024.
Texto: Lenir Camimura
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias
Por: Conselho Nacional de Justiça